quinta-feira, 22 de julho de 2010

Zacarias

Zacarias chegou em casa e se perguntou porque insistia em voltar no horário de sempre. Sua esposa, Karen, tinha ido embora já fazia dois anos. Não suportou sua obsessão pelo assassinato da Verônica. Dizia que até a Dona Marta desistira. Na verdade tinha ciúmes. Veja isso, ciúmes de uma mulher morta. Uma menina. Não teria hoje trinta anos.
Zacarias tinha dores de cabeça fortíssimas desde que sua esposa foi embora. O médico não soube dizer porque. O médico não tentou descobrir porque. Cinco minutos de consulta só foi suficiente para prescrever remédios de dor. Mas ele sabia que era da obsessão. Que a dor vinha porque ele não tinha a resposta.
Naquele dia ele tinha sido obrigado a fechar o caso da Verônica. Perdia, finalmente, sua chance de se tornar herói. A imprensa fez todo o circo que pôde em cima do assassinato. Ele acha que isso atrapalhou, mas entende os motivos. Entende a indignação. Hoje, o circo midíatico parece para ele a única redenção que a menina recebeu. Pelo menos as pessoas acharam errado, entende?
Zacarias estava cansado. Há meses pensava em se matar. Hoje achou que não tinha outra escolha. Foi para casa pensando no que ia escrever no bilhete. Não tinha de quem se despedir, mas achou que era importante um bilhete de despedida. Pensou em Karen. Podia mandar uma carta, mas não queria que ela ficasse se remoendo de culpa em cima de um pedaço de papel. Na verdade, queria, mas achou que ia ser uma atitude egoísta.
Sentou-se em uma cadeira de balanço de madeira. Em frente a janela, ficou sentado até o dia amanhecer. Pensou em tudo que conseguiu. Lembrou sua história, e não conseguiu ver o final feliz dos filmes. Ele gostava de finais felizes. Parecia que todo o sofrimento poderia ser justificado se tudo desse certo no final. Todos os fracassos não importavam se no final alguma coisa desse certo.
A dor na cabeça aumentou, mas ele não viu motivos para tomar o remédio. Logo a dor ia passar. Tinha escrito seu nome em uma das balas. Achou a piada interessante. Usou um esmalte que a Karen deixou. Lembrou-se de um filme que falava que as pessoas que deixam coisas importantes fazem isso porque não querem ir embora. E a Karen gostava de esmaltes.
Arma na boca. Oito da manhã. O telefone toca. Karen. “Te acordei?” “Mais ou menos.” “O Zé me ligou. Falou que fecharam o caso da menina. Você tá bem?” “Volta.” “...” “Volta.” “Volto.”

Da leveza do amor tranquilo

Ela me disse: eu quero a leveza de um amor tranquilo. Amor fácil, meu bem, é para quem tem dificuldade de amar. Para quem encontra no outr...