sábado, 25 de outubro de 2008

Isabel, mais uma vez

Chef


O lugar era pequeno, espaço para umas seis mesas, no máximo, mas havia apenas quatro. Questão de conforto. E mesmo assim não estava completamente cheio, duas mesas ocupadas apenas, contando a minha. O dono era um amigo meu. Ele mesmo cozinhava e servia os clientes, também sugeria vinhos e tudo o mais. E, apesar de eu poder comer de graça, eu preferia ficar só bebendo geralmente. E pela bebida eu pagava, mas só preço de custo. Eu não conseguiria pagar por nada ali se fosse pelo preço do cardápio. Com certeza eu nem conheceria o lugar se o dono não tivesse feito faculdade comigo. Alias, eu não comentei, mas eu me graduei em economia. Eu sou um economista. Eu aprendi a pensar na margem. Quatro anos de curso, os quais eu fiz em cinco, para aprender a pensar na margem. Para aqueles que não entenderam o que eu quis dizer com pensar na margem aqui vai uma pequena explicação. Como um ser racional, eu tenho que pensar “na ultima unidade”... Bem, é meio difícil de explicar sem aquela matemática chata toda. É assim que eu deveria maximizar minha utilidade, meu prazer. Se eu fosse racional, perfeitamente racional, como pregam os modelos dos meus queridos companheiros ortodoxos, eu nunca teria ficado do jeito que eu fiquei com a Isabel. Emoções fodem a racionalidade. Muito. Mas voltando ao restaurante do meu amigo. O nome dele meio que não importa, afinal, do dia que ele contou que tinha feito um curso de culinária em diante a gente só chamava ele de “chef”. Ele tinha acabado de puxar o saco do grupo de babacas riquíssimos que estavam na outra mesa e veio sentar comigo. Trocamos palavras e conversas inúteis durante quase toda a noite. Ele se levantava de vez em quando para atender algum pedido. Nada que tomasse muito tempo, a garrafa de whisky ficava na mesa e eles já tinham se empanturrado de comida e gastado o suficiente para eu conseguir viver durante um mês inteiro. Eles iam lá porque era reservado. Podiam falar das putas que comeram sem as mulheres ouvirem e fechar negócios, legais ou ilegais, em off. E a comida era boa e o lugar bonito. Pagavam um extra pela discrição. Lá pela meia noite, quando os executivos estavam saindo pro puteiro de luxo ou pras suas casas com suas mulheres, o chef me chamou pra sair com ele. Um lugar que ele queria ir, novo. Eu não conhecia, mas fui. A Isabel estava numa viagem de negócios e eu tinha ficado sozinho. Então eu fui. O lugar, foi me dito, chamava Rising Sun, como na música “The house of the rising sun”

domingo, 19 de outubro de 2008

Isabel, novamente

Pausa para lamentação 1


Admito que eu sinto falta da Isabel. Eu sinto falta do sexo. De ver aquela mulher, que se mostrava tão forte, se submetendo carinhosamente aos meus pedidos e olhando pra mim como se eu fosse seu Deus. Do momento em que o orgasmo é o único desejo e a agonia da espera e a precipitação arranham as costas. Eu sinto falta de ver o sorriso sincero da alma cheia, completa. Do prazer correspondido. E do fim. E eu esperaria na soleira da porta dela o tempo que fosse necessário. Sussurrando o nome dela por toda a eternidade. Isabel Isabel Isabel Isabel. Isabel. Ainda sinto o corpo dela. Meu pau ainda a sente. Meus olhos ainda a vêem. Mas eu não teria forças para romper novamente as barras. Isabel é como um vício, eu nunca vou deixar de lembrar, eu nunca vou deixar de ser viciado, mas eu consigo me controlar agora. Porque eu sei que eu ia acabar morrendo ali. E eu não queria morrer ali.

domingo, 12 de outubro de 2008

Isabel 2

Isabel Cia. Ltda.


Isabel tinha longas pernas e belos seios, e desculpem as intertextualidades que se seguem, revestidos de uma pele branca como a neve, gentilmente tocada por um cabelo negro como a noite que cai. Olhos escuros e profundos. Mas era uma mulher real, embora antes eu realmente me negasse a ver isso. Tinha celulite e estrias, senhores e senhoras, e alguns “pneuzinhos” que sobravam para fora de calças mais apertadas. O que não significa que fosse gorda, era até bem magra. E cagava. E usava trinta mil produtos químicos no cabelo e cremes para a pele e tinha que se depilar aqui e ali e tirava as sobrancelhas e tinha mau hálito pela manhã e suava em dias de calor e teve que usar aparelhos quando mais nova e tinha espinhas quando ficava nervosa, apesar das pobres espinhas rapidamente serem eliminadas por mais produtos químicos, e usava quilos de maquiagem para cobrir as espinhas mais resistentes e fazia a unha duas vezes por semana, e usava lápis de contorno labial e ia a academia todos os dias e tomava três banhos, um de manhã, um no horário de almoço e um antes de dormir, e usava perfume sempre e contava freneticamente as calorias de tudo que comia. E tinha tempo de ser competente no trabalho, era gerente de marketing da filial de São Paulo de uma empresa mais ou menos grande, que se preparava para abrir o capital e expandir seus negócios para outros países do mercosul. Ela respondia diretamente para o diretor de marketing, um tal de Bruno. Alto, com um rosto angular e fino. Lábios finos e secos numa boca mais ou menos grande. Cabelos ondulados constantemente penteados para trás com gel. Uma leve barriga de chopp, que ele tenta desesperadamente fazer sumir com aulas de abdominal e horas de esteira. Mas era um cara até gente boa, apesar de bobo. A Isabel não gostava dele, mas fingia que gostava. E ele era apaixonado por ela, dava para ver nos olhos dele. Mas era tímido, o pobre coitado. Ele tentava se mostrar comunicativo e, eu lembro, de uma vez que nós fomos juntos a uma festa. Eu, a Isabel e o pessoal do escritório dela. Ele se virava bem com as garotas, fazia bem o “cerco”, mas não era muito bom na hora, coloquemos assim, de finalizar o projeto. E eu sentia que com ela o problema era ainda maior.
Isabel também era amiga da Flávia, uma mulher cuja idade mental rondava os quinze anos. Não que ela fosse burra, de maneira nenhuma, ela só era infantil no trato com as pessoas. Flávia tinha uma fortíssima vocação para psicóloga. Era o ombro no qual todas as suas amigas iam chorar. E talvez por ser pouco dotada de beleza física, ela não tinha uma vida sócio-sexual muito ativa, problema que ela resolveu vivendo a vida de suas amigas na sua imaginação. Mas no fundo era uma pessoa linda, quase a Isabel “virada do avesso”. Um grande coração. Infelizmente uma grande barriga, proporcional a suas grandes pernas e bochechas e braços e tudo o mais. A Flávia tinha se tornado minha amiga também, mas com algumas restrições. Por exemplo, teve um dia que nós estávamos no bar, só eu e ela, bebendo cerveja. Era um bar pequeno. A palavra boteco se encaixaria melhor do que bar, no caso. Conversávamos sobre o mundo, as guerras, as mortes, a fome, o capitalismo, o socialismo e coisas do gênero. Criávamos teorias e respostas de mesa de bar, aquelas que fazem rir. E rir das possíveis soluções para os problemas do mundo é minha definição de humor negro. Não era o assunto, nem o tipo de humor, preferido da Flávia então com o tempo ela foi parando de rir e ficando mais quieta. Eu desisti do assunto, mas não sabia muito bem sobre o que falar. Não me sentia num dia bom pra fofocas e coisas do gênero, e esses sim eram os assuntos preferidos dela. Fofocas moderadas, que fique bem claro, ela era uma moça confiável em relação aos segredos que contavam pra ela. Eu ainda estava com a Isabel, mas eu já estava tomando consciência do buraco em que eu estava metido e começara a ficar desesperado com a situação, mas o problema ainda não havia chegado ao pico. Ela virou pra mim e perguntou “E como vai você e a Bel?” voltando a esboçar um sorriso no rosto. Eu fui sincero e expliquei pra ela que a Isabel me prendia dentro da minha própria cabeça e que eu estava começando a me preocupar com os efeitos disso em mim e que por isso nós não estávamos muito bem pelo meu lado das coisas e por ai eu fui. E nessa hora ela deu um sorriso solidário e me olhou com um olhar empático e compreensível e disse “Eu te entendo”. E eu odeio isso, e eu odiei ela naquele segundo e por alguns minutos. Não, você não sabe como eu me sinto. Só eu sei como eu me sinto e mais ninguém. Ela nunca tinha passado por nada parecido. Mas o resto nela compensa. Pelo menos como amiga, eu acho. É, só como amiga.

segunda-feira, 6 de outubro de 2008

Os nomes e Isabel

Bem, como iso é um blog e afinal de contas nem todos os textos que eu posto aqui são necessariamente ligados a esse projeto dos nomes, apesar de ultimamente ter sido isso que tem me motivado, eu devo essa explicação que eu vou dar agora. Pelos próximos 13 posts relacionados a esse projeto estaremos dentro do nome Isabel. Eu vou adicionar a tag a ele também, caso haja vontade de olhar coisas específicas dentro dele, afinal de contas são 13 capítulos só disso e ele é bastante mais linear do que os outros posts. Segue então o primeiro capítulo de Isabel.


Isabel


O começo do agora


Ela conseguiu um jeito de me segurar. Por toda a eternidade. Eu tinha certeza que não haveria maneira. Ela entrou na minha cabeça como ninguém mais nunca havia conseguido. Eu era minha própria prisão. Preso a minha moral e ao meu tesão. Meus olhos e meu tato indefinidamente controlado pelas palavras que entravam no meu ouvido. Ela sabia quando me empurrar. Ela sabia controlar meus acessos de raiva, os quais foram se tornando mais e mais constantes conforme eu ia tomando conhecimento do meu estado, da minha condição. Do meu inferno.
Eu conhecia meus pecados, o que nunca fez de mim um homem melhor. Mas quem se importa? Mas agora eu cansei de pecados e interrogações. De agora em diante somente meu ponto final, no máximo uma vírgula ou outra, e só quando for indispensável para a sua respiração camarada leitor como ensinava a tia da terceira série “vírgula é para o leitor dar uma pausa e respirar” mas me acompanhe desconhecido confidente através da linha imaginaria que traçaste logo abaixo das letras para não perder a linha certa aonde o fio do raciocínio se segue e quem sabe para concretizar a imagem das entrelinhas sussurrando segredos no seu ouvido e contando tudo que está oculto para olhos incultos nesse texto, incógnito leitor, acompanhe o relato de como eu rompi as barras da minha antes intransponível cela e corri livre quase sem virgulas e sem interrogações até o meu inevitável ponto final aonde morre o autor deste texto mas que fique bem claro que falo do autor e não da máquina que agora aperta as teclas de outra máquina que materializa palavras em uma tela logo a frente da máquina anterior e talvez venha a enviar ordens para que a tinta de outra máquina se derrube no branco virgem de uma folha de papel. Cansei. Quero vários pontos finais. Ininterruptas pausas. Doses homeopáticas de morte. Assim, eu posso enfraquecer o texto e as frases para elas morrerem já cansadas de existir. Para que outra frase possa nascer e construir a história do texto, que eventualmente morre para o nascimento de outro texto, com um novo autor. E, depois do meu momento de euforia, voltemos ao relato do meu trabalho para romper minhas barras e seu conseqüente sucesso. Mas primeiro falemos Dela.

Da leveza do amor tranquilo

Ela me disse: eu quero a leveza de um amor tranquilo. Amor fácil, meu bem, é para quem tem dificuldade de amar. Para quem encontra no outr...