A janela pisca azul na
parte debaixo da tela do computador, indicando uma mensagem e uma remetente.
Mesmo antes de lida, aquela mensagem não faz sentido, apenas transporta ele
para uma noite três anos antes.
Naquela noite, luzes
piscavam no chão, no teto e nas paredes. Rock ecoava na pista de dança
acolchoada como a cela de um manicômio. Ele encostava na bancada do dj com um
copo de vodka, alguns amigos e muita tontura. Um deles comenta sobre uma garota
que dançava perto deles. "Linda, né?", o amigo fala enquanto tenta
ser discreto. Pela primeira vez ele olha para ela. Bonita, mas não o suficiente
para declarar um "linda" tão empolgado. Tenta ser educado na
resposta, mas parece que a falta de empolgação só deixa o amigo mais animado em
defender a beleza da desconhecida. Só resta a ele fazer seu trabalho de wingman:
o amigo fala com ela, ele fala com o amigo dela. "Escuta, ele sabe que não
tem chance nenhuma com minha amiga, né?".
3 anos depois, era o nome
dela escrito na janela que piscava azul na parte inferior da tela dele. E isso
não fazia o menor sentido. "E aí, Coronel, tudo certo?". O apelido de
Coronel já nem era tão comum. A faculdade tinha acabado. Agora, na agência de
propaganda, o apelido era outro. Aparentemente, agora ele lembrava muito o ator
que interpretou a versão jovem de um ex-presidente.
A mensagem não era tão
bizarra quanto uma voz de uma noite solitária do passado soando no meio de uma manhã
de sexta-feira. O amigo que não tinha chance nenhuma chegou a namorar a menina
que ele achou linda naquela noite. Fora todo o rolo que isso envolveu. Mas, por
pouco mais de um ano, a única vez que eles tinham se visto foi em um bar, no
qual ele mal a reconheceu. Uma mistura de tempo passado, falta de atenção e
mudanças na aparência dela. Naquele momento, ele poderia concordar com o
"linda". Mas estava bêbado e pouco preocupado demais com isso na
hora.
Ia ter o show do Pulp no
dia da mensagem. Por acaso, do lado da agência onde ele trabalhava. Ela
convidou ele para ir. Ele se ofereceu para convidar o amigo em comum,
ex-namorado dela. Afinal, era uma maneira de dar sentido àquela mensagem. O
amigo já namorava uma outra mulher, mas fazia mais sentido do que ela falar com
ele do nada. Conseguiu um ingresso com um colega de trabalho, a quem também
convidou. Até porque precisava não ser a vela da noite que ele imaginava fosse
acontecer. Comprou o ingresso dela. Só o dela, no final o ex-namorado não pode
ir.
Já à noite, ele esperava
ela com o colega em um boteco perto do local do show. Entre copos americanos
cheios de cerveja, fumaça de cigarros e escapamentos se misturavam à palavrões
e piadas. Além do colega que ia com ele, mais um estava lá bebendo uma cerveja
pós-trabalho. Entra ela, flutuando sobre a calçada irregular de um dos metros
quadrados mais caros de São Paulo. Apresentações são feitas já seguidas de
despedidas. O colega que não vai ao show olha para ele com um olhar que diz
"Ela é muito gata, cara. Foda isso. Na hora que você me falou no almoço
que ia pro show com uma amiga eu não imaginei que fosse tão gata. Como que uma
mina assim sai com um cara como você." (Eu poderia estar conjecturando,
mas ele me explicou o olhar com essas exatas palavras depois.)
No show, ela paga o
ingresso para ele com fichas de bebida enquanto explica que tinha terminado
recentemente com o namorado que veio depois do amigo dele. E que ele estava lá.
O Pulp pergunta "Do you remember the first time?". O ex dela pergunta
se eles podem conversar. Aquela conversa que sempre vira briga. Whatever common
people do. O ex vai embora. O show continua. Álcool, luzes, dança e
reclamações. As luzes se acendem eventualmente. Eles vão embora. O ex ficou com
ciúmes e ele achou a ideia do ex dela com ciúmes do amigo do outro ex dela até
engraçada. Ela deixa ele em casa e ele espera o elevador enquanto pensa "Como
diabos eu não tinha percebido o quanto ela é linda?".
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